Cozinha à Marinex
Atire a primeira pedra quem nunca comeu uma receita borbulhante feita num Marinex, servida nos inquebráveis pratos Duralex.
A cena sempre se repetia nos almoços de família: de quando em quando, alguém era fisgado pelo cheiro da comida na cozinha e, sorrateiramente, corria dar aquela espiadela no Marinex dentro do forno.
Se uma lasanha lá estivesse, era inevitável dar uma leve dobrada nos joelhos para conferir o molho de tomate borbulhando nas paredes translúcidas da travessa. Depois, era só pegar um prato Duralex (de preferência fundo, para não transbordar) e servir uma fatia bem graúda.
Essa onipresença das louças Duralex, Marinex e Pyrex em nossas vidas está diretamente ligada à longevidade das mesmas. Foi em 1950, que a vidraria Santa Marina, revolucionou o mercado com um refratário de vidro que suportava altas e baixas temperaturas. Ou seja, sua avó, bisavó e quiçá sua tataravó ostentavam um belíssimo jogo de louças de inquebráveis pratos cor âmbar, xícaras de vidro leitoso (que imitivam louça) e travessas de vidro transparente.
Almoços de domingo sempre foram um acontecimento em casa - e também a desculpa perfeita para cometer uma sobremesa grandiosa. E quando criança, a sensação da época era o Bolo Sorvetão: um engenhoso pavê, com várias camadas de biscoito champanhe intercaladas com creme. Quando pronto, era certeza que a bronca viria, pois era impossível resistir passar o dedo na sobremesa, enquanto ela pernoitava na geladeira.
Do Bolo Sorvetão ao Fricassé de Frango (que minha mãe batizou de “Frango Da Hora"), do Nhoque à Lasanha gratinada, não existiu uma receita que um Marinex não desse conta lá na casa dos meus pais.
Mas, uma que eu considero a mais bonita e hipnotizante é a da Gelatina Mosaico, em todas as suas formas: várias camadas uniformes na horizontal, bicolores na vertical ou aquela de formas variadas, que mais parecem o famoso chão de caquinhos paulista. Se ela fosse servida numa travessa de porcelana, perderia todo o charme.
Outro clássico da cozinha da Família Dias, que ganhava uma beleza a mais quando empratada nas travessas de vidro, era a bacalhoada ao forno. Diferente da foto acima, minha mãe intercala fileiras com postas de bacalhau e cebolas inteiras assadas, salpicando várias rodelas de ovo cozido, azeitonas pretas sem caroço, batata e tomate. Para finalizar, um banho na receita com uma concha cheia de azeite borbulhante com alho frito. Vinho do porto de aperitivo acompanhando, sempre.
Para finalizar essa grande homenagem, um dos pratos que mais gosto de preparar e servir naquele clássico Marinex redondo de borda alta, é polenta. Veja bem, depois de você dedicar quase meia hora, mexendo lentamente o fubá na panela, em fogo baixíssimo, o mínimo que essa receita merece é ser exposta, assim como uma obra de arte rara, protegida pelo vidro praticamente inquebrável. Se intercalar camadas de queijo e molho de tomate, fica um espetáculo.
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Que maravilha, esse é o Brasil que eu mais amo! Na minha família usamos para fazer cremes de cupuaçu, torta de maçã, escondidinho de carne do sol e de carne de fumeiro.
Nunca uma edição da Coifa me fez tanto querer voltar no tempo ❤️