Das poucas memórias que guardo antes de completar meus 10 anos de idade, em meados dos anos 80, a da casa na cidade de Paranapanema, interior de São Paulo, é uma das mais marcantes.
Quando se é pequeno, tudo à sua volta é grande, e o quintal da então recém-construída casa era uma imensidão. Um frondoso abacateiro emprestava seus galhos para virar balanço, e as cascas secas dos frutos que caíam no chão viravam capacete, para o horror da minha mãe.
Um belo dia, meu pai resolveu ter um milharal no quintal. Era capacete de abacate na cabeça, espada de espiga de milho na mão e castigo atrás da porta, após ter estragado parte da plantação e inutilizado mais um uniforme da escola.
(Sabe aquele milho cozido que ficou na geladeira? Debulha ele, refoga com manteiga e cebolinha que fica uma delícia)
Tenho a mais absoluta certeza que todo mundo tem uma boa lembrança que envolva o milho. Provavelmente as festas juninas são as mais recorrentes, mas por aqui as minhas memórias sempre remetem aos restaurantes de beira de estrada. Culpa dos mais de 500km que tenho que encarar sempre que vou visitar meus pais em Presidente Prudente, no velho oeste paulista.
Ali na região de Santa do Parnaíba, mais precisamente no bairro Recanto Maravilha III, na altura do Km 40 da Rodovia Presidente Castello Branco, as bandeirinhas amarelas flamulam sem parar, anunciando que você está prestes a entrar no “Playcenter do milho verde", mais conhecido como Castelo da Pamonha.
(Não se deixe enganar por essa foto triste, nesse link aqui você vai ver que as pessoas realmene se divertem no Castelinho da Pamonha)
Mal dá tempo de sair do carro, falar oi pra estátua de milho que te recebe de braços abertos, e você já está cercado pelas mais diversas iguarias de milho.
(Sorvete, suco e pamonha…como pode o milho ser responsável por um trio ternura desses? Foto: Debora Silveira)
Tem sorvete, chocolate, pamonha, fubá, doces diversos, sorvete, suco, sopa, empada, tudo de milho. Para evitar uma bela de uma azia, eu sempre vou no clássico milho cozido e pamonha. Mas a empada e o sorvete de milho é uma excelente pedida.
Outro restaurante de beira de estrada que ficou gravado na minha memória foi o Vó Belmira Pamonharia, em São Gabriel do Goiás (GO). Esse casarão rosa, levemente tingido pela terra vermelha da região, foi uma bela surpresa durante a viagem de carro de Brasília (DF) até Alto do Paraíso (GO).
Se não bastasse esfregar o Empadão Goiano e o Suco de Milho na cara dos viajantes, eles conseguiram amalgamar dois ingredientes, milho e pequi, em uma pamonha tão farta que mais parece uma chinela tamanho 44. Vou repetir aqui, pra ficar bem claro: PAMONHA RECHEADA COM PEQUÍ.
(Caro Dean Arthur, autor dessa foto, o senhor merece um prêmio por essa composição chipa gigante, empanada, empadão goiano, pamonha tam. 44 e coquinha gelada)
Ah, e tem também os empadões goianos com recheios para carnívoros, vegetarianos e, claro, para os adoradores de pequi. Dica: seja generoso, abra o bolso e arremate o máximo de pimentas, farofas e conservas de pequi que você puder. Você não vai encontrar sabor igual em outro lugar.
Já aqui na cidade de São Paulo, esse cereal maravilhoso se faz presente o ano todo. Nos meses de junho e julho é aquela esbórnia que todo mundo já conhece bem. Na imensidão da capital, não faltam opções de festas juninas e julinas, mas isso é assunto para um boletim especial. Logo abaixo, listei três lugares onde você não vai se arrepender de pedir:
Além de ser uma refeição pra lá de farta, o Nara traz nas composições do obentô da casa essa maravilha que está sendo segurada por um hashi: um bolinho de milho tão cremoso e crocante, que é injusto vir um só. Tem opções para carnívoros e vegetarianos.
Quem conhece o Rong He, sabe que os pratos servidos no restaurante são absurdamente fartos. Entre as montanhas de dumplings, massas e frituras do cardápio, está lá a sopa de milho verde, ou melhor, uma piscina olímpica. Cuidado para não se afogar, é muita sopa mesmo!
Especialista em culinária de raíz caipira e capixaba, a chef Angelita Gonzaga decidiu criar essas pequenas obras de arte feitas de milho crioulo. Tem pastel de angu recheado com queijo montanhês, tem vegano e tem até churros de milho. Cola no perfil deles pra fazer o pedido.
Conhece o milho crioulo?
Foi em 2019 que os agricultores familiares Lucas e Marcone, parceiro no Projeto Vista Alegre, celebraram a primeira colheita milho crioulo, cerca de 800 quilos de grãos, entre vermelhos e pretos. Um ano depois, em parceria com Anna Guasti (Casa Guasti), formou-se o Projeto Crioulo.
Quem está acostumado a comer o milho verde, vai se surpreender com a variedade de cores e sabores dos milhos amarelos, vermelhos e pretos. Das iguarias do projeto, eu já comprei os fubás. As polentas e broas aqui de casa nunca mais foram as mesmas. Corre lá no site deles pra comprar.
E pra finalizar essa suculenta edição do Coifa, recomendo você ouvir o episódio “Milho miraculoso” da Rádio Arado de Ouro, que conta toda a importância do milho nos primeiros século de Brasil Colônia.
O Coifa é um boletim com histórias de cozinha. Curtiu o Coifa? Assine e indique pros amigos :)